sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Entrei para a faculdade. E agora?

Bem, gostaria de compartilhar com vocês minha experiência como acadêmica. Como sabem, sou formada em enfermagem. 

Antes de entrar para o curso, pensei em seguir várias carreiras. 

Quando criança, queria ser veterinária; depois sonhei com a carreira militar (especificamente Aeronáutica); também vivi aquela fase em que não sabia o que faria... em meados do Ensino Médio, comecei a pesquisar sobre as várias carreiras: ia à biblioteca e lá ficava horas e horas folheando revistas e artigos sobre. Pensei em fazer Economia, Turismo, Medicina Veterinária e até mesmo Direito. Logo desisti. No início do 3º ano do Ensino Médio, comecei a me interessar pela Enfermagem. Fui pesquisando, pesquisando e cada vez mais me interessava pela área. 

Nessa época, um amigo nosso de longa data estava se formando em Ciências Biológicas e nos contou que fora chamado para trabalhar em uma pesquisa na Grécia, cujo objetivo era pesquisar o DNA da aranha. Pensei: "Caramba, que máximo! Ciências Biológicas até que combina comigo... e tem lugar melhor para trabalhar do que em um laboratório?" 

Minha mãe, a partir daí, quis que eu seguisse a carreira de bióloga. Não vou dizer que não pensei na possibilidade, mas eu sabia que, no fundo, meu coração estava na Enfermagem. E decidi segui-lo.

Nas primeiras aulas de Anatomia, tive muita dificuldade. Os laboratórios eram pequenos e minha turma era enorme. A professora fazia o possível para que eu compreendesse o que ela falava (pois fazia leitura labial) mas nem sempre era possível. O 1º período foi dureza; pensei em desistir, tinha dificuldades nas matérias, e além disso, alguns professores dificultavam muito. Não os culpo, afinal, nunca tinham "lidado" com uma aluna deficiente. Minha mãe me deu muita força nesta época.

Eu explicava a minha condição aos professores e pedia-lhes sempre que falassem de frente comigo para que eu pudesse ler os lábios. E eles atendiam, mas muitos, envolvidos pelo decorrer da matéria, acabavam "esquecendo". Dispôr a sala em círculo também era uma dificuldade, caso o professor ficasse circulando dentro do círculo (desculpem-me o trocadilho, risos). As perguntas feitas pelos demais colegas geralmente eu não entendia, não olhava, pois preferia focar minha atenção na explicação do professor. 

Encontrei professores que me auxiliaram demais; me deram atenção, procuravam saber se eu estava compreendendo a matéria. São mestres inesquecíveis, e que fazem jus ao título.

Para compensar as dificuldades que eu tinha, enfiava-me nos livros. Passava madrugadas estudando. Além das matérias, havia trabalhos, oficinas, cursos de extensão...

Todos os estágios que fiz foram maravilhosos. Os profissionais que encontrei, os pacientes, funcionários das instituições, os professores... todos bastante compreensivos e simpáticos. Mas me preocupava o fato de não poder auscultar. Eu me sentia uma enfermeira "pela metade", embora fosse capaz de realizar grande parte das ações de competência do enfermeiro. Mais tarde (bem depois de formada) eu viria a saber da existência de estetoscópio amplificado (específico para surdos).
Uma professora minha conversou comigo sobre especializações em áreas onde não há muito contato com o paciente. Confesso que fiquei meio decepcionada porque cuidar do paciente diretamente era algo que aprendi durante toda a faculdade, praticamente, e gostava muito, pois o simples ato de aplicar uma medicação ou passar uma sonda me fazia sentir útil.
Depois, fui pesquisando sobre especializações como Gestão em Serviços de Saúde, Auditoria, Enfermagem do Trabalho, Análise de Contas Médicas, etc. Me interessei muito pela área de Gestão, mas acabei fazendo Enfermagem do Trabalho, que gosto muito, embora meu desejo ainda seja cursar Gestão ou Auditoria. E graças a Deus, não estou tendo dificuldade nenhuma.

Resolvi falar sobre essa experiência porque sei que muitos deficientes, espalhados pelo País, estão passando o mesmo que eu passei. A estes, eu digo: não desistam. Lutem. É difícil, é estressante, é complicado. Você irá encontrar pessoas que não estarão "nem aí" pra você, e também irá encontrar pessoas que te darão o maior apoio. Estude muito, pegue livros, estude com alguém, peça o caderno de anotações emprestado. Gravar as aulas em áudio também ajuda.

E aos professores, mestres: conversem com seus alunos. Perguntem a eles: "O que eu posso fazer para melhorar o seu aprendizado?" Com certeza, não há coisa melhor do que ver um professor que se importa com você e quer o seu sucesso.
Bom, por hoje é só.

Um abraço e até a próxima!

Keylla.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Minha mais nova aquisição...

Bem, desde o início do blog, eu queria abordar o assunto sobre Aparelhos Auditivos. E não é pra menos: segunda-feira dia 18 de outubro, finalmente finalizei os documentos para a aquisição de meu mais novo precioso (carinha de Sméagol danadinho): meu aparelho auditivo Siemens Music Pro SP!  \o/

Depois de várias tentativas, com outras marcas, digamos assim, mais promissoras e com as quais eu estava ansiosa para experimentar, mas que no fim virou uma decepção... eu me sinto mais aliviada.

De início, experimentei os aparelhos da Phonak, Naída IV, SP e UP. Foram semanas e mais semanas de ajustes. O som não saía limpo, houve um pouco mais de percepção em alguns ruídos, mas nunca saía limpo... o som ficava mais abafado, como se as vozes estivessem falando de dentro de uma caixinha. E a compreensão? Péssima em algumas coisas e boa em outras. Não me adaptei de jeito nenhum.

Em alguns momentos, cheguei a chorar de raiva e de medo de não conseguir encontrar o aparelho perfeito pra mim. Com muita conversa, minha fonoaudióloga e sua secretária (pessoas maravilhosas e super atenciosas) disseram que iriam continuar e me fazer provar todos os aparelhos até que eu encontrasse aquele que eu me adaptasse perfeitamente. 

Infelizmente, um produto que é bom pra alguns pode não ser bom para outros. Cada ouvido, cada perda auditiva é diferente. Cada percepção é diferente. Duas pessoas podem ter a mesma porcentagem de perda auditiva, a mesma classificação de surdez, se experimentarem o mesmo aparelho, é possível que uma se adapte bem e a outra não. E é normal.

Quando minha fono viu que o aparelho não estava fazendo o efeito esperado, resolvemos tentar com a Siemens. Por eu já possuir um aparelho desta marca (o antigo, embora seja um híbrido, analógico com algumas tecnologias digitais) conjecturamos que a adaptação seria melhor devido o fator familiaridade. E deu certo! 

Enfim, estou feliz. A percepção vai melhorando com o tempo, o som é bacana e não me dá dores de cabeça, é limpo e agradável. O aparelho é um pouco maior do que o antigo, mas hoje (digo HOJE) nem me preocupo com a estética. Há uns anos atrás recusei um ótimo aparelho (que seria  esse meu anterior, se não fosse minha frescura) por questão de aparência. Me arrependo profundamente. Hoje eu quero comodidade e bons sons pra mim. Quero poder exercer a profissão que amo, certa de que estou com a melhor tecnologia possível. Estética pra mim é o de menos: pra quê? Me tornar mais “apresentável”? “Esconder” que possuo uma deficiência? Ficar mais “atraente"? 

Era este o meu pensamento de anos atrás. Não queria nem saber, ou me dava um aparelho pequeno ou ficava com o velho caindo aos pedaços e já quase aposentado. Mas no decorrer do tempo, amadureci e vi que, se alguém quiser me namorar ou ser meu amigo, também terá que aceitar o “bônus” (risos) que vem comigo, seja ele grande ou pequeno.

Estou dizendo isso porque tenho uma amiga que há um tempo atrás me confidenciou que o cara com quem ela tinha um relacionamento sério de 8 meses disse a ela para não usar o aparelho auditivo quando saíssem para se divertir. Tenho certeza de que se alguém me falasse isso um dia, com o perdão da palavra, iria mandá-lo passear. Seja quem for.

No fim é tudo uma questão de auto-estima e de se aceitar como é, sem neuras, sem essa necessidade louca de se sentir aceito pelas pessoas. Claro que isso é uma batalha diária, que travamos todos os dias. 

Enfim, meu próximo passo é adquirir um estetoscópio amplificado, meu high tech superpotente hahaha... e quando essa experiência acontecer, vou contar tudinho aqui, as primeiras impressões, os prós e contras de cada marca.

Um abraço e até a próxima!

Keylla.

domingo, 17 de outubro de 2010

Bullying

Hoje vamos falar um pouco sobre o bullying. Mas antes, permitam-me contar sobre a minha experiência pessoal como vítima desta prática, tão comum na minha época como o é agora.

Passei quase toda a minha adolescência isolada na escola. Da 2ª à 8ª série, fui praticamente uma pessoa solitária, pelo menos no âmbito escolar (pois na igreja possuía alguns amigos). Minha timidez também não ajudou muito: deixava de fazer perguntas aos professores para sanar minhas dúvidas e acabei me ferrando legal na Matemática. Resultado: aulas particulares, que me salvaram e me fizeram acompanhar o ritmo do resto da turma e recuperar as notas. 

No recreio (ou intervalo), minha atividade preferida era leitura. Eu encontrava na leitura o amigo que eu precisava, que me contava história e eu me permitia aventurar pelas suas páginas, desconectando-me do mundo real e alheia a tudo que não fosse aquilo que se encontrava em minhas mãos. Em 1 semana eu conseguia ler uns 3 livros, geralmente.

 Quase no finalzinho do Ensino Fundamental, eu fiz amizade com 4 pessoas de lá, por sinal, pessoas incríveis. Meu melhor amigo virou meu namoradinho... ééé... precoce! (risos)

 O Ensino Médio foi onde eu desabrochei. Não fui muito popular, mas também não fui recatada. Tinha um ótimo relacionamento com os colegas, todos me conheciam e eu conversava com todos. Perdi grande parte da timidez. 

A faculdade foi melhor ainda. Encontrei ali verdadeiros anjos que me auxiliavam muito, me emprestando o caderno, estudando horas a fio comigo, mas também companheiros nos momentos de diversão... enfim, foi muito bom e sinto muitas saudades. Acho que à medida em que se vai amadurecendo, percebemos que todos são diferentes, seja em inteligência, beleza, esperteza, atitudes, e tantos outros atributos, e passamos a respeitar a individualidade e as características que nos fazem ser únicos e ser quem somos.

Bem, vamos ao bullying.

Bullying (bully - valentão) é um termo em inglês usado para descrever atos de violência física ou psicológica, intencionais e repetidos, praticados por um indivíduo ou um grupo de pessoas com o intuito de intimidar/agredir outro (s) indivíduo (s) incapaz (es) de se defender. É uma prática muito comum nas escolas, sendo mais prevalente em idades de 11 a 13 anos.

Segundo uma pesquisa feita pela Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e à Adolescência (ABRAPIA) 41,6% das vítimas de bullying 
admitiram não ter solicitado ajuda de outras pessoas. Entre aqueles que pediram, apenas 23,7% tiveram êxito. Ainda de acordo com esta pesquisa, mais da metade dos alunos autores de
bullying afirmaram não ter recebido nenhum tipo de orientação ou penalidade por seus atos, o que favoreceu o aumento das ocorrências desta prática (NETO, 2005).

Existem 3 tipos de bullying, segundo Martins (2005): diretos e físicos, com agressões físicas, roubar e/ou estragar objetos dos colegas, extorsão de dinheiro, forçar comportamentos sexuais, obrigar a realização de atividades servis, ou a ameaça desses itens; diretos e verbais, como apelidar, "tirar sarro", comentários racistas ou preconceituosos; e os indiretos, que incluem excluir sistematicamente uma pessoa, fazer fofocas ou boatos, ameaçar exclusão do grupo em troca de favorecimento ou manipular a vida do colega. 

Neto (2005) lista as principais consequências para as vítimas, para os autores e para as testemunhas envolvidas com o bullying

Vítimas → quando o bullying começa na infância, são mais propensos à depressão e baixa auto-estima quando adultos; prejuízos financeiros também estão relacionados, pois passam a necessitar de vários serviços, como auxílio psicológico, educação especial, justiça da infância e da adolescência, entre outros. O relacionamento com a família também pode ser prejudicado, caso a vítima se sinta traída pelos pais, quando estes não demonstram acreditar em seus relatos ou em suas ações.

Agressores →  quanto mais precocemente se iniciam na prática do bullying, maior é o risco de apresentarem comportamentos anti-sociais na vida adulta, bem como perda de oportunidades, instabilidade no trabalho e relacionamentos afetivos pouco duradouros.

Testemunhas → descontentamento com a escola e comprometimento do desenvolvimento acadêmico e social.

Mas, e o bullying contra os deficientes (em geral)? É um assunto muito mais complexo e ocorre de forma velada, e é muito mais sério do que parece, segundo a Revista Nova Escola (leia a reportagem na íntegra), que apresenta 6 soluções diante desta questão:

1) Conversar sobre a deficiência do aluno com todos na presença dele.
2) Adaptar a rotina para facilitar a aprendizagem sempre que necessário.
3)Chamar os pais e a comunidade para falar de bullying e inclusão.
4)Exibir filmes e adotar livros em que personagens com deficiência vivenciam contextos positivos.
5)Focar as habilidades e capacidades de aprendizagem do estudante para integrá-lo à turma.
6) Elaborar com a escola um projeto de ação e prevenção contra o bullying.

É preciso uma ação conjunta entre professores, pais, pedagogos, psicólogos, comunidade e os próprios alunos, e também a aplicação de projetos que visem incluir o portador de necessidades especiais na comunidade, a fim de melhorar o desenvolvimento social, psicológico, mental, permitindo que o aluno tenha liberdade para desenvolver suas habilidades e talentos. 

Informação, educação e conscientização é a chave para um ambiente saudável e para um mundo melhor. 

Um abraço e até a próxima!
Keylla.

Fontes: 


sábado, 16 de outubro de 2010

Um pouco de mim...

Bem, eu não poderia começar este blog sem poder falar um pouco sobre mim e sobre minha história de vida.

Eu nasci com perda profunda em ouvido direito, não ouvia absolutamente nada. Aos 9 anos, comecei a perder gradativamente minha audição no ouvido esquerdo. Comecei uma bateria de exames em BH, onde eram frequentes as idas ao otorrinolaringologista, o qual, em nossa última consulta, disse que eu morreria surda, pois iria perder gradativamente a audição até ficar surda completamente e que nada neste mundo resolveria a minha surdez; nem aparelhos, nem remédios, nem cirurgias.

Mamãe, guerreira e serva de Deus que é, pôs-se a orar e dizer a Deus que não aceitava aquela situação e que a última palavra não seria a do médico, mas sim a Dele. 

Dois anos depois, a resposta de Deus veio em um telefonema de minha tia, que morava em São Paulo, pedindo para que eu me submetesse aos cuidados médicos de lá. Médicos excepcionais, por sinal: atenciosos, simpáticos, profissionalíssimos e com uma vontade notável de ajudar. 

E a partir daí nossas viagens a São Paulo foram ficando cada vez mais frequentes. Eu e mamãe ficamos em torno de 3 anos nessa batalha. Meu primeiro aparelho auditivo, comprado com muito esforço, consegui lá. É, realmente... a última  palavra foi mesmo a de Deus.

Lembro-me de uma consulta em SP, onde a nossa médica queria que eu fizesse um exame de visão para analisar se haveria alguma chance de ficar cega. O exame foi marcado para o dia seguinte e logo mamãe se pôs entrar em contato com os membros de nossa igreja para nos ajudar em oração. Minha irmã (mais velha) "surtou", angustiada, imaginando como eu viveria sem poder ouvir e sem ver (pois dependia e dependo ainda hoje, da leitura labial para me comunicar). 

Mas graças a Deus e às orações dos irmãos amados, o resultado foi negativo. 

Eu sou uma pessoa cristã. Ou pelo menos tento ser, no meu dia-a-dia. Acredito em Deus, na Bíblia, nos ensinamentos de Cristo. Tento segui-los, colocá-los em prática todos os dias. 

Minha história de vida está intimamente ligada ao meu relacionamento com Deus. 

Este blog não vai tratar de religiões, nem discuti-las, tampouco opinar ou criticar sobre a religião alheia. Não é essa a intenção. Não sou de denominação alguma, e nem farei apologia a quaisquer instituições religiosas. 

Bem, enfim, essa é apenas uma parte da minha história. Tem muitas outras coisas que gostaria de compartilhar com vocês, num momento mais à frente. Espero poder aprender com vocês, compartilhar experiências, dúvidas e poder mostrar um pouquinho do nosso mundo, para aqueles que não são surdos ou que não convivem com a comunidade/pessoa surda. 

Um abraço e até a próxima!!!